2011-12-01

Décimas para um fado actual

Moderna morte a fadiga.
Falta-me trabalho e dinheiro,
Mas não me faltam promessas,
Para uma visita ao coveiro.

Destino turvo e curvado,
Tristes estradas e caminhos,
Todos juntos ou sozinhos.
Uns de frente outros de lado,
Um ou outro mais chegado.
Levo a mão que mendiga,
E a boca que mastiga
Por vergonha está cerrada.
Tenho uma vida cansada
Moderna morte a fadiga.

Agora que estou sem lei
Conto-te a história da vida,
Da minha por ser vivida,
Porque das outras não sei.
Por lá perto eu andei,
Tinta do mesmo tinteiro,
Cortiça do mesmo sobreiro.
Conto-te de mim onde estou.
Onde estive, para onde vou,
Falta-me trabalho e dinheiro.

Agora que tudo perdi,
Derrapagem sem sentido,
Sem direito a desmentido,
Olho em silêncio para ti.
Perdoa-me se não reagi,
No passado de onde regressas,
Nas minhas noites sem pressas,
Guardo em mim a tua imagem,
Margem da outra margem,
Mas não me faltam promessas

De todo o meu sentimento,
Estou mais farto do que velho,
Mais despido, mais vermelho,
Vítima deste momento,
Sou sacrilégio, sou tormento,
Sou um homem meio inteiro,
Cortaram-me pelo meio.
É a alma que se agarra,
Tristemente a uma guitarra,
Para uma visita ao coveiro

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