2021-03-18

Despedida I

  Procuro uma resposta como se fosse importante. Procuro uma resposta porque é importante. Se não fosse importante não doía tanto. Dura à cinco anos a minha despedida. Começou numa manhã de Janeiro, uma manhã solarenga e morna, uma manhã fora de época. Começou com um telefonema, um apelo, um grito de socorro sussurrado ao ouvido, Paulo, podes vir cá, Sim Pai, passa-se alguma coisa, Vem cá que depois falamos. Desliguei o telemóvel e fiquei suspenso. Senti urgência em saber, senti angustia sem lhe conhecer a razão. Durante os últimos anos, os anos em que o meu Pai ficara só, fruto do divorcio que o separou da mulher com quem casara após enviuvar da minha Mãe, que eu pressentia desgraças quando o telefone tocava e ele não estava presente. Mas quando atendia e lhe ouvia a voz, a minha alma repousava suavemente nas suas mãos. Nessa manhã de Janeiro isso não aconteceu, nunca mais aconteceu.

  Nessa manhã morna e solarenga saí de casa com o coração nas mãos deixando apenas espaço para segurar no volante. Toquei à porta do prédio e subi as escadas galgando lanços até estancar à porta do 1º E. A porta ainda estava fechada e eu controlando a respiração bati suavemente com os nós dos dedos na madeira, És tu Paulo, Sim, sou eu Pai, podes abrir. O meu Pai ainda estava de pijama e tinha um ar cansado e ao mesmo tempo assustado, Preciso falar contigo. Fechei a porta e segui-o até à mesa da sala de jantar. Paulo eu aceito a tua ideia, corriam-lhe lágrimas pela cara, fiquei desarmado, abracei-o e chorei com ele. O que ele aceitava era a ideia que eu lhe sugerira de ele ir para um lar. A doença avançava rápido e com o meu trabalho não havia muitas soluções disponíveis. Almoçamos juntos, eu, ele e a neta que fui buscar à escola. Um almoço de silêncios que só eu e ele compreendíamos, um almoço que ela estranhou, mas que foi diluído nas preocupações normais de uma adolescente.

Sim, foi assim que começou a minha despedida...  

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