2006-11-27

Por vezes estamos sem fazer nada...

Por vezes estamos sem fazer nada, preguiçosos da vida, preguiçosos de tudo. Levantei-me tarde, quase uma, e liguei o computador. Quase embalado no ruído do arranque da máquina, olhava para o ecrã. O ambiente de trabalho, os atalhos, os ícones…E eu adormecido, olhando as palmeiras de uma viagem às Caraíbas, quase sentindo o calor e a humidade daquele entardecer. Passaram alguns segundos, ou terão sido minutos? Não sei! Passou um pouco daquilo a que chamamos tempo…Quando não está a chover…Se estiver a chover o tempo é mau…Que merda de tempo…Chuva e vento e…Não estou a falar desse tempo…Desculpa…Onde é que eu ia?...Estive por momentos distraído de tudo, sim eu sei que liguei a máquina, mas liguei-a sem objectivo definido, talvez só para a ouvir trabalhar, agora que penso nisso até me parece um bom motivo, para de me interromper! Está bem…Levei a mão ao rato…Ao quê?...Já te disse para não me interromperes! Podes ficar ai, dentro de mim, mas sossegado, está bem?....OK!
Liguei-me à net, Homepage, favoritos, alguns blogs e a minha irmã a recordar-se e eu a recordar-me, não com as suas recordações, com outras, minhas, de outras pessoas, de mim, de mim em casa com vinte e tal a ouvir música, sempre a ouvir música, já vos contei que tive um baixo assinado para me expulsarem do prédio…E isso interessa…Cala-te!...Sim a ouvir música e um dia toca-me à porta o João Paulo, era visita da casa, assim como muitos outros, amigos, amigas, eu vivia sozinho mas tinha a casa cheia, morava ao pé de locais de encontro e quando esse não acontecia a campainha tocava. “Quem é?”, “Sou eu!”, a voz familiar, hoje alegre e satisfeita, satisfeita por voltar a Portugal depois de umas vindimas no sul de França que não correram muito bem. “Entra, estava a fazer uma.”, “Tens mil paus?”, “Para que queres os mil paus?”, “Tens ou não tens?”, “Tenho!...”, “Dá-me lá os mil paus e não me faças perguntas…Eu venho já!”. Tinha confiança no João Paulo, havia respeito na nossa relação, identificávamo-nos nas revoltas, ânsias, ambos sem mãe…O que é que isso interessa?...Na altura interessava e ajuda a compreender a história. O João Paulo não tinha mãe, o pai era tenente coronel ou coronel e tinha uma irmã mais nova. Não gostava de estar em casa, vivia para o dia, se possível pedrado…Mas era o que todos faziam, ou quase…Porra cala-te! Deixa-me acabar que depois falo contigo.”. Adiante! Demorou uns vinte minutos até que voltei a ouvir a campainha, um dling-dlong fraco porque precisava de pilhas novas. Entrou radiante com um disco debaixo do braço, “Agora sim podes fazer-me uma!”. Dirigiu-se para o gira-discos sem me deixar ver a capa, escolheu uma música, levantou o som e inundou-me a casa de “Blues”, aquele blues do Texas, branco e acelerado, “Isto é Gary Moore, um gajo que foi guitarrista nos Thin Lizzy, agora toca Blues, conheci isto em França.”. “Texas Strut” era o nome da faixa…E ainda é…Estou mesmo lixado contigo…
Ouvimos o álbum todo e repetimos alguns temas, lembro-me de mim…Novo…A sentir-me velho ao ouvir “As the Years Go Passing By”.
O João Paulo Morreu já há alguns anos, de overdose, vivia com uma moça bonita, as cores de Timor na pele, na Venda Nova, às portas de Benfica.
Viu-o a última vez na estação dos comboios da Amadora, eu já trabalhava cá em baixo, tinha partido o carro e tinha de ir de camioneta. Bebemos umas cervejas e demos um abraço, gostava de lhe ter dado um abraço maior, “Vê lá se apareces.”, “Quando tiver carro é mais fácil, eu prometo.”, promessa que não cumpri, que nunca pensei cumprir, eu que fugi de Lisboa para fugir do Mundo e de mim, por isso está calado!
Isto saiu-me mesmo assim e agora que estou acabando não sei se o deva postar…Não foi para isso que o começaste?...Foi, mas descambou e também por tua culpa!...Deixa-te de merdas, posta isso e vai almoçar…Desta vez tens razão…

5 comentários:

naturalissima disse...

Senti uma profunda INQUIETUDE dentro de mim ao ler estas palavras.
História de muitas outras... de uma alma INQUIETANTE!
Mas como sempre muito bem escrita.

Um beijinho e uma boa semana também para ti
Daniela

Isabel disse...

Este foi o abraço que gostarias de ter dado ao João Paulo e não deste.
Como eu gostaria de ter abraçado com mais aperto, com o coração mais junto alguns amigos como po teu aquem um dia disse eu apareço e nunca apareci... agora não é possivel a morte apareceu antes de mim.

És uma alma única, e as tuas duvidas sinceras a tua fragilidade assumida torna-te um ser especial.

Morreu tambem Cesariny.
Foi de viagem.
Partiu.
Dei-lhe um abraço homenageando-o com modestas palavras.
O abraço que tambem gostaria de lhe ter dado antes.
Continuarei a abraça-lo cada vez que o ler.

Mas hoje quero acenar-lhe um até sempre.
Foi isso que fiz lá no meu sitio.

Até já e mais uma ves obrigada pelo que escreves.
É bom encontrar seres humanos, de vez em quando.

Isabel

Titá disse...

Mano, ao som de "As the Years Go Passing By”, que tu me mandaste e misturando recordações: tu do João Paulo, eu dos no secrets, receaste que lesse este post, porque não querias que me deitasse a chorar.Meu querido Guerreiro.

HOje senti-me velha, mas com uma energia fantástica ao som desta música e visualizando por entre as tuas palavras mil e cem imagens passadas.

É verdade que choro, mas choro de alegria por te ter como irmão, por podermos ambos recordar tantas situações boas, aconchegantes, bons amigos. Somos tão priveligiados MAno, já pensaste nisso? Como somos priveligiados por tudo o que já vivemos e pelos amigos que fomos fazendo ao longo da vida? Daqueles amigos que passam anos, vidas e nunca se esquecem e qd regressamos estão lá.

Agora estou a rir. Sorrio sempre qd me recordo de tua casa: Da correria das visitas,o pessoal que entrava e saia, o que abancava e ia estando sempre por lá, das tardes mais calmas a ouvir música, das conversas, discussões...do cheiro, do fumo no ar, e sempre, sempre a música.

Voltei a chorar. És tão puro. Achas que nunca deste mesmo esse abraço grande ao João Paulo?
Deste sim. deste esse abraço e muitos outros a tantos outros, com a tua forma de ser, a tua lealdade na amizade e esse respeito que havia entre os dois e que te referiste aqui.

Queres maior abraço do que esse?
Se há alguém que nunca deixa por mostrar o que sente por alguém, esse, és tu. Podes não o dizer sempre por palavras, ou por abraços, mas dizes de tantas outras formas.

Nunca deixes de ser como és.De assumir tua emoção e de recordar sempre quem foste, porque foste sempre uM HOMEM EXTRAODINÁRIO...Sempre, mesmo quando tu não acreditavas nisso.
Uma abraço grande... daqueles de sentir o coração um do outro.
GMT MAno

Titá disse...

Só para confirmar o que escrevi aqui ontem À noite no meio de muita emoção e de um turbilhão de reordações:
Hoje encontrei o Kajo de manha, na estaçao. Falei-lhe de teu post.
Resposta imediata: "Se houve alguém q foi amigo do JPCamarão, esse foi o Guerreiro!"

O teu abraço foi dado...deste-lhe muitos abraços.

GMT Mano
Aquele nosso abraço

pb disse...

olha, não consigo comentar, desculpa-me....deixo-te um abraço