2007-10-07

Branco

Branco,
Sou branco, tenho quarenta e dois anos e sou branco,
Podia ser azul, cor-de-rosa, amarelo, mas não…
Sou branco…Por definição…por justificação…
E vejo branco, no branco dos meus olhos,
Vejo branco na minha maneira de ser.
Disseram-me o que era o branco,
Do lado de cá,
Do ocidente.
Eu vejo branco,
Eu pinto de branco,
Eu sonho em branco,
Fizeram-me branco e criaram-me branco.
Se alguma vez fugir,
Fujo em branco.
Não fui eu quem inventou a cor,
Sou consequência.

Pálidas as faces
Das pessoas que por mim passam.
Em certas alturas, na rua, no passeio,
Tudo se desfoca,
Olho para eles e vejo-me.
Pálidos os reflexos
Das manhãs cinzas que inventei.
Janeiro borralho e a humidade nos vidros.
A borra castanha escura,
Escuro do negro,
No negro do café.
A língua que se revolve na boca procura
O doce meigo do açúcar,
O frio que cede ao calor,

Levo o jornal debaixo,
Não sei se do braço, se de todo o arco.
Da coluna arqueada saem coisas,
Demandas, cansaços, os gastos quotidianos,
Pormenores, e tantos que eles são!

Hoje, por ser hoje,
Pensei no que fui, no que sou.
Sobra-me a mim o lado lógico do contador de anos.
Moderno equilíbrio que gasta todas as peças,
Reciclado está o futuro para quem o há-de comer,
O plágio irónico à saída do autocarro.
Falta-me um pouco de vida para o fim de carreira,
Do emprego que vai para além do fim do mês, no fim de mais um dia.
Sou branco,
Digo-o como se tivesse importância,
Justificando, quem sabe,
A falta de outra cor.

1 comentário:

Titá disse...

uauuuu!Simplesmente genial!