2012-08-20

Bateria, percussões e vozes: Duarte Lemos

Duarte é um homem calmo. Baixo, forte e calmo...até pegar nas baquetas. Duarte transforma-se quando se encontra por detrás de uma bateria. Pelo menos é essa a ideia que Jó guardou do baterista da sua primeira banda, o homem que aguentava todo o projeto com uma marcação rítmica impiedosa. Efetivamente Duarte não mudou muito. Calmo, baixo e forte. É certo que perdeu quase todo o cabelo e por esse motivo decidiu desde há alguns anos andar de cabeça rapada, mas isso não lhe retirou o charme quase incompreensível com que continua a conquistar o coração das incontáveis mulheres da sua vida. Há quem diga que são os seus olhos grandes de bom gigante, de um azul-bebé desconcertante, os responsáveis por tão profícuo desempenho. Outros dizem que o seu desempenho está mais relacionado com outro tipo de órgão que não propriamente o da visão. Seja como for Duarte nunca se viu só, mesmo quando as más-línguas dizem, com inveja mal disfarçada, que ele é uma segunda escolha crónica. Certo é que ele está no sítio certo à hora certa, com as palavras e a atenção que nos momentos de fragilidade convencem uma mulher.

Duarte é um homem dos sete instrumentos no que isso pode significar em termos profissionais. Andou lá por fora na construção civil, serviu às mesas no algarve, foi taxista em lisboa, transportou mulheres por bares de alterne em terras transmontanas, trabalhou como padeiro nos subúrbios de Paris, foi segurança em centros comerciais, serviu em bares de hotel e traficou o que tinha de traficar para poder consumir quando o vício foi grande mas nunca deixou de tocar bateria.

É um homem simples, talvez por isso, sem medos. Não o afetam as notícias de catástrofes, guerras, epidemias, crises, desemprego ou qualquer outra fobia desencorajadora. Acredita no dia à dia, basta-lhe acordar para encontrar o seu ritmo. Também na música ele é assim. Marca certo, forte, sem falhas ou invenções desnecessárias e dura as horas que forem necessárias. Quem toca com ele aprecia-lhe a fiabilidade e a batida viril. Da sua parte não existem surpresas mas consegue acompanhar e manter a magia dos outros. Não é herói ou vedeta nem nunca teve pretensões a tal mas a sua presença no palco e a forma como bate nas peles não deixam ninguém indiferente. É difícil não gostar dele. Sabe ouvir, não importa o que lhe contem nem a hora a que o façam. O seu olhar compreensivo sem ser condescendente convida-nos à confissão. Duarte faz bem a quem está mal.

Quando o telemóvel tocou Duarte estava ocupado. Nos seus braços uma mulher jovem de pele escura tentava convencê-lo a ir para Angola. Ouviu ao longe o apelo do toque e não ficou indiferente. A mulher, que enroscada no seu corpo lhe sussurrava junto aos lábios, não se apercebeu dessa ligeira inquietação. O telemóvel calou-se e ele agarrou-a com força, ela impou com o aperto mas deixou-se virar. Antes de entrar nela e enquanto lhe mordiscava o lóbulo da orelha disse-lhe “A tua proposta é muito tentadora…A ti, rainha das africas, eu entrego o meu corpo escravo”. O riso dela terminou num gemido agitado.

Não será hoje que o Tristezas vai falar com o Duarte.

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