2006-07-17

Solidão


Mais um fim-de-semana em casa, de volta à mãe. Há trinta e dois anos que volta sempre para ela. A cidade que tanto o fascinou, agora não lhe diz nada, precisa de amigos…Onde estão?
O trabalho vai andando, esse novo trabalho que tanto o entusiasmou dois anos atrás.
Acabou o curso em Coimbra, tarde, que bom seria o tempo parar…
…Nas férias recorda-se da sua infância, voltavam a estar juntos, como quando a ribeira enchia cortando-lhes o caminho para a escola.
Alguns casaram, o Romeu, a Madalena, o Júlio, o “Andorinha”, a Isabel, foram ficando cada vez menos, a cada regresso menos caras conhecidas. Aprendeu novas amizades, mas também esses se foram, para fora, como ele, estudar, trabalhar…Alguns ficaram, casaram, outros ainda continuam bêbados, agarrados a uma juventude, perdidos entre o horário de trabalho e a “Noite”.
“Mãe, vou passear o cão!”, “Com este calor?”, “Não te preocupes…Levo o chapéu!”, “Vens para o lanche?”, “Sim mãe!...”
O Romeu é pai vai para dois anos, ainda não está casado de “papel” mas é como se estivesse. Vem, com a companheira e o filho, está um bocado e vai-se embora. Um dia convidou-o “Aparece lá em casa!”, “Eu apareço!”…Mas não é a mesma coisa.
Meteu a Rosa no carro…Basta abrir a porta. A cadela deve o nome a uma namorada que o deixou…Foi no dia a seguir que a comprou, tinha dois meses. De Rosa passou a Rosí e cresceu, a sua “pastora”.
Entrou no café, o Gabriel estava sentado com três garrafas de cerveja, chamou-o e indagou “A tua mãe disse-te?”, “O Quê?”, “Que estás convidado para o meu casamento…E para a despedida de solteiros.”, sorriram, cada qual com seu motivo, “Vais casar?!?”, “Algum dia tinha de ser!...”.
Do grupo só falta ele, de todos só ele vem para casa sozinho, dormir com a mãe. Sente-se isolado, domingo à noite volta para a cidade, “Mãe, arranjaste-me a mala?”, “Sim!...E carreguei-te o telemóvel.”.
Passou o período de experiência e a visita de três meses à fábrica no Brasil também é passado. Foram três meses loucos…Trouxe uma tatuagem com o Sol…E um piercing no mamilo…A mãe não lhe falou durante umas semanas, só o essencial, à distância, “Estás bem?”, “Estou!”, “Precisas de alguma coisa?”, “Não!”, Vens cá no fim de semana?”, “Sim!”, “Adeus!”, “Adeus mãe!”,
Depois ficou a rotina…E dois companheiros do trabalho. Tem um apartamento em Almada mas não janta em casa. Sai tarde e come qualquer coisa onde calha. Espera pelos dias de folga que já não lhe trazem segurança, alegria, quanto muito descanso.
Domingo à noite diz, “Hoje quero dormir cá em casa! Vou amanhã de manhã!”, “Queres que te acorde às cinco?...”, “Sim Mãezinha! Obrigado…”.
Em silêncio, à noite, chora. Um choro sem convulsões, duas pequenas lágrimas e acabou…

9 comentários:

lo disse...

Olá
olha so nao é que o nino tb tem uma tattoo como eu e pircings
:))))))))
beijoooooo

pb disse...

revejo-me neste teu conto, os amigos que se mudaram, as promessas de encontros futuros sempre adiados...que bom seria o tempo parar. Um abraço

Titá disse...

Tb eu me revejo nesse conto e nessa solidão.
Há pouco senti algo assim. Ainda que nos voltemos todos a encontrar naquele café, já não é a mesma coisa.
Acredito é que tem que haver então outra coisa, melhor talvez, que compense...tem que haver...temso que encontrar.
Adorei
Adoro ler-te, por muito suspeita que seja, adoro ler-te e tenho que to dizer ;-))

naturalissima disse...

Angustiante!
História de muitas histórias de SOLIDÃO!
Parte de nós mesmos lutar contra o nosso mal estar, o nosso sofrimento, os nossos MEDOS!
Parte de nós mesmos observarmo-nos e analisarmo-nos pars encontrar os nossos erros e saber ultrapassar os obstáculos da vida que nos prendem a redes maléficas de sociedades consumistas, egoístas, solitárias, desumanas e de sonhos superficiais e falsos.
Muitas vezes temos de ser nós a cortar cordões que nos prendem aos qua não nos deixam crias asas e voar.

P. gostei muito... gosto muito de ler as tuas postagens. Muito interessantes e muito boas para analise a nível psicológico e sociológico.

Um beijinho
Daniela

Suga_Mentes disse...

Parabéns , consegues ser pior que eu ...

Suga_Mentes disse...

nostalgicamente falando ...

Miguel Baganha disse...

" A day in life... " ou melhor dizendo: " A life in a day... "

Só pra deixar um abraço, amigo Guerreiro ;-)

P. Guerreiro disse...

Esta foi mais uma história...Nesta história invejo o protagonista...Pela mãe...

Anónimo disse...
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